Primeira semana (15 a 21 de março)
Olá Diário,
Antes de começar a escrever aqui
tenho de te informar de uma coisa:
estou de quarentena. Ouviste bem, estou mesmo de quarentena desde o início da
semana. Eu sei que queres saber o porquê, portanto aqui te deixo, nos próximos
parágrafos, tudo aquilo que me leva a partilhar a casa durante pelo menos um
mês com a minha família. Antes de avançarmos, queria deixar esclarecido que eu
gosto muito deles, mas sejamos sinceros: um mês, todos juntos nesta casa, sem
poder sair, 24 sobre 24 horas, digamos que será um desafio. Feito este desabafo
deixo-te aqui os mais recentes acontecimentos da atualidade.
Uma simples pergunta, antes de mais:
o que é uma epidemia, e o que é que a diferencia de uma pandemia? Claramente
que não sabes a diferença e eu confesso que também não sabia, portanto decidi
fazer alguma pesquisa. Aparentemente considera-se uma epidemia “a rápida disseminação duma doença sobre um
grande número de pessoas, numa determinada região, dentro de um curto período
de tempo” (isto segundo a Wikipédia), já uma pandemia é, ao contrário da
anterior, uma doença infeciosa que se espalha entre a população, sobre uma
vasta área geográfica, por exemplo um continente. Não sei se já deu para
perceber, mas esta é a nossa realidade, neste preciso momento: a Humanidade
está, mais uma vez, a ser posta à prova, tal como fomos quando apareceu a peste
negra, entre 1348 a 1350 sensivelmente, só que agora com COVID-19, uma espécie
da família dos coronavírus. Pois é, parece que este nosso amigo chegou sem qualquer convite e está decidido a ficar por
mais uns tempos. Não sei se conseguiste perceber, mas obviamente ele não foi
bem-vindo à nossa festa e, apesar de
lhe tentarmos dar com os pés, como se costuma dizer, ele não parece querer ir
embora.
Como é uma pandemia, o COVID-19
espalhou-se pelo mundo inteiro: já matou milhares de pessoas, infetou outras
tantas e aprisionou as restantes nas
suas casas, tal como eu. Sei que estou sempre a dizer: “Estou cansada” ou
“Preciso de férias”, mas este novo conceito de “férias” não é, claramente, o
que eu estava à espera. Sinceramente o que me custa mais sobre estar de
quarentena não é o facto de estar em casa, é sim não saber quando é que posso
voltar a sair. Esta coisa de estar
confinada a quatro paredes sem saber quando é que efetivamente posso sair de
casa para desfrutar, por exemplo, da primavera, porque sim, essa já chegou, mas
estamos tão preocupados e atarefados que nos esquecemos totalmente de que ela
já nos veio bater à porta, está a dar comigo em louca (como se diz em bom
português). Uma das minhas resoluções de ano novo era precisamente fazer de
2020 o ano, mas parece-me que o
início da década tinha outros planos. É curioso só sabermos dar valor ao que
tínhamos nestas alturas de aflição.
Como forma de ocupar os meus tempos
livres, tenho tentado variar os meus hobbies:
fazer os trabalhos que os professores nos pedem; ver filmes e séries; pintar e
desenhar (o que, muito sinceramente, não é o meu forte); fazer exercício físico;
cozinhar; ler; entre outros. Também mantenho contacto com os meus amigos
através das redes sociais, videochamadas ou chamadas de voz, mas não é a mesma
coisa. Atrevo-me até a dizer que soa a artificial. É engraçado que agora começo
a aperceber-me da necessidade constante do ser humano de manter o contacto, e
não falo através das redes sociais, porque apesar de essas possibilitarem a
comunicação a uma escala global, não nos transmitem a presença da pessoa. Pode
até soar cliché, mas apesar de elas nos aproximarem, de certa forma também nos
afastam. A realidade é que agora esta é a nossa única forma de manter o contacto
entre familiares e amigos, ou até mesmo entre diretores/chefes e os seus
respetivos trabalhadores, através do chamado teletrabalho. Existem ainda as
aulas online que eu, por exemplo, não tenho, mas já existem milhares de alunos
por todo o mundo que as têm. Eu posso não ter as aulas virtuais mas recebo
trabalhos para realizar durante a quarentena, o que, de alguma forma acaba por
fazer com que me mantenha ocupada.
No início, quando se começou a
falar do COVID-19, ninguém pensou que fosse possível chegarmos a este cenário com
estas proporções: um cenário quase de guerra, onde já é necessário fazer a seleção
das pessoas que vivem e das que não terão tanta sorte. É triste. As famílias veem
os seus morreram e sentem-se inúteis, sem poder ajudar, deixando tudo nas mãos
daqueles que, nestas alturas, são reconhecidos como os heróis: os médicos, os enfermeiros
e os auxiliares de saúde. Esses heróis trabalham horas e horas a fio, exaustos,
sem forças e condições, dado que todos os dias recebem mais visitantes no seu museu, de onde esperam sair com uma recordação da loja de visitas: a saúde recuperada. São também
heróis aqueles que arriscam a sua vida em viagens para garantir que não falta
comida nos super e hipermercados - os motoristas; os polícias que asseguram o
cumprimento do estado de emergência, que, infelizmente, não é respeitado por
parte da população, que continua a acreditar que certas coisas só acontecem aos
outros; entre muitas outras profissões que, lamentavelmente, só nestas
situações de pânico e aflição é que são reconhecidas.
Sabes, esta coisa da liberdade é
engraçada: demo-la por garantida. Não estou a dizer que agora não sejamos
livres, porque efetivamente o somos, estou-me a referir à liberdade de poder correr
na rua sem ter medo de que este convidado
indesejado tente entrar na nossa
festa. Essa liberdade agora é apenas recordada com alguma saudade e muita
necessidade de ser recuperada com urgência.
Filipa
Filipa gostei muito de ler esta parte do teu diário.
ResponderEliminarParabéns.