Querido de quarentena,


     Sinto-me presa, encurralada até. Sinto-me cansada, exausta, esgotada. Esgotada, sim. O mais estranho é que não tenho feito muito para estar esgotada. Para além dos exercícios e dos imensos trabalhos que os professores nos têm dado para fazer, não tenho feito muito. Passo os dias a ter aulas e quando, milagrosamente, arranjo tempo para mim estou a escrever, a desenhar, a ler ou a ver televisão. Não tenho feito muito, é verdade, mas fui obrigada a isto.
Tenho-me esforçado por me manter ocupada e não andar a divagar por entre os meus pensamentos. Eu podia tentar ser a filha perfeita e ajudar cá em casa, mas sou demasiado preguiçosa para certas coisas. Podia ser a aluna perfeita e estudar os dias todos, mas se já não o fazia antes, agora ainda parece mais improvável vir a fazê-lo. De qualquer modo, sinto mais vontade de estudar agora, talvez seja por não me sentir tão obrigada, tão forçada a fazê-lo. Enfim… adiante.
Estou de tal maneira presa que até ficar a apanhar sol na varanda, aproveitar o dia a ouvir música e observar a rua, que devia estar movimentada pelas pessoas a passar ali como um dia normal, já não é suficiente. Já não é relaxante, acolhedor. Bem-vindo.
     Lembro-me que adorava (sim adorava, pretérito imperfeito) ir para a janela e ver as pessoas a passar, a ir para o trabalho ou para a casa de familiares ou só a passar por passar. Gostava desses momentos em que tudo estava bem, normal, certo. Saudável. Agora, até isso me foi tirado. Ainda não mencionei o grande culpado desta minha infelicidade porque estou zangada com ele, furiosa até. Estou de relações cortadas com ele e com esta situação que ele criou, na qual me tornou prisioneira. Obrigou-me a ficar fechada nesta minha torre, apenas com a janela para servir de porta para o exterior, mas sem o ser realmente. Obrigou-me a ter de ficar privada da minha liberdade, dos meus amigos, dos meus familiares, de tudo.
Estou de tal maneira encurralada dentro destas quatro paredes, que só agora é que descobri que nunca antes tinha ficado a conhecer tão bem o meu quarto. Descobri que até gosto de passar os dias todos inteirinhos com a minha família, mas não me interpretem mal, também percebi o porquê de haver tantas discussões nos reality shows.
Não tenho amado esta situação, é verdade, mas todo este tempo não tem sido mau de todo. Tenho de admitir que, perante as circunstâncias, temos estado a aguentar-nos e a manter-nos unidos. É a essa ideia que me agarro nos momentos em que me sinto mais desanimada.
Enfim, se o grande responsável por esta situação me pudesse ouvir, dir-lhe-ia: - não afirmo que te perdoo, mas digo que te irei perdoar, eventualmente.
O tempo o dirá.
                                                                                                                              K.S.
Padlet - Profª Regina


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